Durkheim,
Emile, REGRAS
RELATIVAS À DISTINÇÃO ENTRE O NORMAL E O PATOLÓGICO. Terceiro capítulo da obra As regras do método
sociológico, Editora Abril, série Os Pensadores, 1978, pg.110.
No terceiro capítulo do livro depois de uma
exposição sobre métodos científicos validos para a avaliação a qual se pretende
o autor, Durkheim propõe que façamos uma analogia do corpo humano sobre a
questão da saúde, primeiro ele toma como exemplo o contraponto que há em uma
diátese ser silenciosa e indolor com a experiência de suplício que é ter um
pequenino graveto dentro dos olhos e a relação é bem clara, coisas
terrivelmente danosas podem ser silenciosas enquanto outras pequenas serem tão incomodas
que nos tiram a paz.
“Há graves diáteses que
são indolores, enquanto que certas perturbações sem importância, como as que
resultam de um grão de carvão que se introduz num olho, provocam um verdadeiro
suplício”. (pg.111)
Ainda nas analogias com o corpo
humano o autor inicia uma série de questionamentos especulativos sobre a observação
da adaptação humana ao ambiente:
“...a saúde, consistindo num desenvolvimento feliz das forças
vitais, se identifica com a perfeita adaptação do organismo ao meio,
classificando, pelo contrário, como doença tudo o que perturba esta adaptação?”
(pg.112)
Com isso o autor nos induz a perguntar – qual o meio de adaptação mais
perfeito que o outro? Já que estamos relativizando o processo de adaptação para
cada indivíduo? Mas Durkheim nos chama a atenção de que não é somente o
processo de adaptação ao ambiente externo que faz com que possamos regular
saúde e doença, há outro fator interessante:
“Mas não é apenas ela (a doença)
que produz este efeito. As funções de reprodução, em certas espécies
inferiores, implicam fatalmente a morte, e mesmo nas espécies mais
desenvolvidas implicam sempre certos riscos”. (pg. 112)
Dada essa definição Durkheim pretende
fazer entender que não é só o processo de adaptação ao ambiente que faz com que
possamos auferir saúde e o contrário, isto é, quando não podemos resistir ou
ficamos a mercê das condições, a doença, o que ele nos leva a entender é que
naturalmente existem funções que podem causar o abatimento ou até mesmo a
extinção de determinado ser por condições absolutamente normais. Ele então
frisa – No entanto, são normais.
”A velhice e a infância tem os mesmos efeitos, pois o velho e a criança
são mais acessíveis às causas de destruição. Quer isto dizer que são doentes e
que só o adulto representa o tipo são?”. (pg.112)
Conclui-se pelo raciocínio que há na
existência da vida causas naturalmente que conduzem o ser a um estado de
vulnerabilidade ou até mesmo morte. Não desprezando ainda que há muitas doenças
que produzem um efeito de imunidade nunca antes adquirido pelo organismo o que
é um resultado muito bom.
Ainda que partamos da premissa
comparativa de que a sociedade é como um organismo vivo e que o sociólogo e o
biólogo tratam de objetos de estudos diferentes, porém com resultados
semelhantes, não há uma impossibilidade na sociologia de se retirar uma amostra
e isolá-la para experimentá-la como ocorre na biologia, sendo portanto
indefinível saber quando nasce ou morre uma sociedade.
De modo que resta ao exame social a análise
dedutiva com conclusões e presunções subjetivas, partindo sempre de uma
observação do sociólogo ao objeto analisado, mais a frente Durkheim passa a
associar as ideias de que existem fatores sociais que são normais e outros que
são patológicos porque fogem à regra e são relativamente imprevisíveis e inesperados:
“Chamaremos normais aos fatos que apresentam as formas mais
gerais e daremos aos outros a designação de mórbidos ou de patológicos”.
(pg.114)
Na realidade
Durkheim propõe que o sociólogo a exemplo do fisiologista estude a sociedade
com base no tipo médio, isto é, a normalidade do comportamento social será
tomado pela média e nunca pelos seus extremos isso resulta o objetivo da
análise:
”O que o fisiologista estuda são as funções do organismo médio e em
sociologia passe-se o mesmo”. (pg.114)
Não podemos nos impressionar com
dados informados sobre qualquer instituição social a título de exemplo não
poderíamos nos impressionar com uma redução de 10% na mortalidade infantil no
Brasil em 2012, dizendo que este número é ínfimo ou alarmante se pela média de
anos anteriores esse número for normal.
E caminhando para amarras as ideias
quanto à normalidade de todas as instituições sociais Durkheim vai se valer do
exemplo do crime, quando diz:
“Transformar o crime numa doença social seria o mesmo que admitir que a
doença não seja uma coisa acidental mas que, pelo contrário, deriva em certos
casos da constituição fundamental do ser vivo; consistiria em eliminar qualquer
distinção entre o fisiológico e o patológico. Pode sem dúvidas acontecer que o
crime tome formas anormais; é o que acontece quando, exemplo, atinge uma taxa
exagerada. Efetivamente, não será de duvidar da natureza mórbida deste excesso.
Mas é normal a existência de uma criminalidade que atinja mas não ultrapasse,
para cada tipo social, certo nível que talvez não seja impossível de determinar
de acordo com as regras precedentes”. (pg.119)
Durkheim diz
mais,
“Classificar o crime como um fenômeno de sociologia normal não significa
apenas que seja um fenômeno inevitável, ainda que lastimável, provocado pela
incorrigível maldade dos homens; é afirmar que é um fator de saúde pública, que
é parte integrante de qualquer sociedade sã”. (pg.119)
O autor muito perspicaz faz uma alusão a um modo de vida
social totalmente abnegado provando que ainda assim haveria um tipo de crime
que condenaria as consciências dos homens, um convento:
“Imaginai uma sociedade de santos, um convento exemplar e perfeito. Os
crimes propriamente ditos serão desconhecidos; mas os erros que consideramos
veniais ou vulgares provocarão o mesmo escândalo que o delito normal provoca
nas consciências normais”. (pg.120)
Acrescenta:
“O crime é portanto necessário; está ligado às condições fundamentais de
qualquer vida social e, precisamente por isso é útil; porque estas condições a
que está ligado são indispensáveis para a evolução normal da moral e do
direito”.
O crime na sociedade é como uma instrumento regulador para as
consciências em desenvolvimento é necessário como cita o autor acima porque por
elas a moral e o direito são avaliados e julgados pelos seus atos e efeitos.
Concluindo chegamos à síntese de que na sociedade existe um
nível de normalidade médio para todos os fatos sociais e que estes níveis são
saudáveis ainda que sejam o crime e o suicídio, o que a sociedade deve temer é
a variação extreme destes índices que podem e certamente indicam uma anormalidade
ou uma patologia no quadro social.
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