São Paulo
2013
O QUE É UM FATO SOCIAL?
Durkheim, Emile, O que é um fato social? Primeiro capítulo da obra As regras do
método sociológico, Editora Abril, série Os Pensadores, 1978, pg.87.
Logo na introdução do texto o autor se prende a diferenciar o que são os
fatos sociais, ele se vale de dizer que ao contrário do que pensam alguns sobre
os fatos sociais eles não são todos
os fenômenos que ocorrem na sociedade. Se assim o fosse todos os indivíduos na
sociedade bebem, dormem, comem, raciocinam e isso é necessário à sociedade, porém
não se caracterizam como fato social.
Se o objetivo da sociologia fosse observar estes fatos ela estaria disputando um
campo de estudo com outras áreas como a psicologia ou a biologia. Mas há na sociedade alguns fenômenos impares
que acontecem que não são objetos de estudo de outras matérias ao que ele chama
de fatos sociais.
Durkheim os
define assim:
“Quando desempenho minha obrigação de irmão, esposo ou cidadão, quando
satisfaço os compromissos que contraí, cumpro deveres que estão definidos, para
além de mim e dos meus atos... Quantas vezes acontece de ignorarmos os
pormenores das obrigações que nos incumbem e, para conhecê-los, termos de
recorrer ao Código... Do mesmo modo os fiéis, quando nascem, encontram já
feitas as crenças e práticas da sua vida religiosa; se elas existiam antes
deles é porque existiam fora deles.” (pg.87).
Assim
podemos definir o fato social, isto
é, o fenômeno com que o indivíduo se depara ao nascer, ao vir à sociedade,
recebe e o pratica independente da sua consciência individual, independente da
sua vontade própria e que está de acordo com a coletividade.
Mas os fatos sociais são fenômenos que tem uma
atuação muito interessante sobre os indivíduos porque eles são tanto imperativos quanto coercitivos, não há como resistir a eles sem que sofrer algum tipo
de sanção de pena social, ainda que esta pena seja um motivo de chacota por
outros indivíduos, segue Durkheim:
“Se
não me submeto às convenções do mundo, se, ao vestir-me, não levo em conta os
usos seguidos no meu país e na minha classe, o riso que provoco e o afastamento
a que me submeto produzem, ainda que duma maneira mais atenuada, os mesmos
efeitos de uma pena propriamente dita”. (pg.88)
Diferente dos fatos orgânicos e
psicológicos do ser humano aos referidos o autor nomeia-os como sociais, pela própria caracterização do
seu modo coercitivo de fazer os indivíduos agir, pensar e sentir, ainda que o
indivíduo esteja dentro de outros grupos sociais menores, por exemplo, os grupos
religiosos, políticos, profissionais.
Ao contrário da crítica individualista que promove a ideia de
que o homem é um ser absolutamente autônomo, os fatos sociais não diminuem o homem por mostrar que ele não age, nem
pensa, nem sente por si só, mesmo sabendo que as nossas ideias e tendências sociais
não são próprias e fruto de nós mesmos antes resultado da interação com a
sociedade infiltrando-se se impondo a nós:
“Sabe-se que a coação social não exclui necessariamente a personalidade
individual”. (pg.88).
Até aqui o
que vimos nos parece que os fatos sociais
são todos os fenômenos sociais cristalizados e institucionalizados pela
sociedade, na verdade não é só isso, temos também o que podemos chamar de correntes sociais que não deixam de ter
sobre os indivíduos o mesmo poder de coerção ainda que não tenham um corpo tão
bem definido como os primeiros exemplos acima. São elas que podemos sentir
quando em um agrupamento de pessoas somos impelidos a tal ou tal atitude mesmo
que não concordando com aquilo somos arrastados a fazê-lo por uma pressão
social imediata, caso resistamos a ela. Na verdade aquele sentimento estava inconsciente
em nós, isso nos levará a uma falsa impressão de que fomos nós que decidimos
por aquela atitude, no que na verdade fomos impelidos a isso.
“Uma vez dispersa a assembleia, finda a ação das influências sociais
sobre nós, e ficados a sós, os sentimentos por que passamos dão-nos a impressão
de ser algo de estranho em que já não nos reconhecemos. Apercebemo-nos nessa
altura que fomos sua presa, mais do que seus criadores”. (pg.89).
É deste modo que podemos ver
indivíduos cometerem atos que sozinhos não cometeriam e atos de atrocidades que
voluntariamente não poderiam cometer senão quando no meio de um grupo ou em uma
assembleia.
Tais fatos
nos remetem a observar como a sociedade se esforça para educar as crianças ao
modo de pensar, de agir e de sentir que sozinhas elas não poderiam chegar
nunca.
Durkheim faz
uma importante definição no fim deste capítulo, ele diz que não é a
generalização de um fenômeno que o caracteriza como um fato social, estas são na verdade as encarnações individuais é como cada indivíduo recebe o fato social e reage a ele. O grande
desafio do sociólogo é conseguir perceber o estado de alma coletivo da
sociedade, então teremos aí definidos os fatos
sociais. Finaliza Durkheim:
“Um fato social reconhece-se pelo seu poder de coação externa que exerce
ou é suscetível de exercer sobre os indivíduos; e a presença desse poder
reconhece-se, por sua vez, pela existência de uma sanção determinada ou pela
resistência que o fato opõe a qualquer iniciativa que tenda a violentá-lo”.
(pg.92)
“É um fato social toda a maneira de fazer, fixada ou não, suscetível de
exercer sobre o indivíduo uma coação exterior”; “que é geral no conjunto de uma
dada sociedade tendo, ao mesmo tempo, uma existência própria, independente das
suas manifestações individuais”. (pg.93)
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