Resumo
O objetivo deste trabalho é mostrar a
relação entre Direito e Religião desde os povos primitivos. Abordando as
relações e derivações que cada matéria teve sobre a outra e como a religião
pode influenciar o direito e como o direito regula as relações religiosas na
idade primeva bem como contemporaneamente, passaremos as vistas no direito
primitivo hebraico arcaico tanto o código Hamurabi, posteriormente as Tábuas da
Lei de Moisés e toda a relação jurídica decorrente destas tradições,
observaremos como se iniciou o direito grego e romano que foram o berço da
sociedade ocidental.
Introdução
Neste momento nos remeteremos a uma ilha imaginária,
um lugar paradisíaco com muitas palmeiras, árvores frutíferas, fauna e flora exóticas,
distante do continente o suficiente para fazer do lugar um verdadeiro santuário.
Na ilha, além de tudo isso como se não bastasse, há também um ser humano, vive
sozinho, isolado da civilização, mora em uma cabana feita de material rústico
onde se protege das intempéries da natureza, tem um espaço onde cultiva seu
próprio alimento, confecciona sua vestimenta, de algumas ervas desenvolveu alguns
remédios, faz dos seus dias uma rotina regrada, desenvolve seus hábitos, é
senhor de si mesmo, dele emana a sua própria fonte de interesses, não
estabelecendo nenhuma relação de direitos e deveres com outrem, ele não está
vinculado a qualquer obrigação a não ser aquelas fisiológicas que lhe obrigam
naturalmente em função da sua própria subsistência, como por exemplo, cultivar seus
os alimentos, pescar seu próprio peixe, segundo Hans Kelsen (1881
— 1973) - onde não há conflito de interesses não há necessidade de justiça,
assim podemos fazer uma leitura da situação deste humano até este momento. Porém,
um dia desembarcam na ilha cinquenta outros seres humanos com o intuito de
habitá-la e explorá-la, dividem-se em grupos e passam a formar uma sociedade, a
partir de então a privacidade daquela ser humano solitário é maculada com a
presença de seus pares, tudo muda, o espaço onde morava deve ser agora
redimensionado em função das novas moradias, o lugar de plantio também, outros conflitos
surgirão, origina-se então outras fontes de interesses que não necessariamente
coincidem com as daquele homem, os mais fortes imporão sua vontade através da
autoridade, é exatamente neste momento na relação de convivência que surgem os
conflitos de interesses, delimitar direitos, deveres e obrigações é essencial
para razoável socialização destas pessoas, esta é função do Direito.
Esta ilha imaginária nos serviu bem para
mostrar como se dá aplicação do Direito, isto é, ele opera na esfera de uma
situação conflitante de interesses, houve neste caso hipotético o conflito
entre um habitante original e um grupo maior que chegou depois dele, evidente
que caberia uma discussão quanto ao direito original daquele homem, porém isso
não pode ser impeditivo à socialização do mesmo com os demais, por serem estes seus
pares, fazendo uma reflexão do caso em tela concluiríamos que o Direito por si
próprio surgiu exatamente assim milênios atrás, isso não poderia estar mais
errado, embora isso não desabone nosso exemplo acima citado o direito nasce na
verdade de uma outra experiência humana, a religião. Antes que houvesse algum
tratado legal, código de leis, ordenamento jurídico no mundo, haviam crenças,
das quais nascem toda a mentalidade acerca dos direitos, deveres e obrigações
que podemos imaginar.
Fato é que a observação dos fenômenos
naturais em tempos remotos fez que os homens concluíssem a existência de uma
relação misteriosa, divina, espiritual com seres etéreos, foi ouvindo sons dos
trovões que os homens chegaram a deduzir a existência dos deuses celestiais
conversando entre si, foi pelo temor dos raios das tempestades que julgavam
serem setas de julgamento da ira dos deuses contra as maldades dos homens, mas
também eram dadas dádivas aos deuses por suas colheitas, pelo sol, pela chuva,
e demais benesses que os deuses davam aos seres humanos, evidente que não
podemos julgá-los por estas definições tão esclarecidas para nós hoje, era o modo
que eles explicavam a mais complexa indagação do ser humano - a Existência.
Pensar em responder com objetividade nossas perguntas mais cruciais ainda hoje
deveria nos remeter a certa resistência haja vista que ao longo dos séculos
testemunhamos as contradições existentes em nossas conclusões mais absolutas e
convictas principalmente no campo científico, verdades absolutas de hoje serão
superadas amanhã, por isso é necessária muita reverência ao tratar com tais
temas primitivos.
Ademais, não podemos esquecer que
caminhamos sobre uma estrada pavimentada por tais humanos do passado. E que se
hoje podemos conhecer mais sobre nós mesmos é porque em algum momento alguém se
dedicou a pensar, observar, registrar, e transmitir experiências para a
posteridade.
- Direito nas sociedades primitivas
Segundo muitos especialistas é possível
constatar que, na maioria das sociedades remotas, a lei é considerada parte
central do controle e ordem social, usada para prevenir, remediar ou castigar
os desvios das regras prescritas. A lei nos tempos mais remotos já exercia a
função de manter a coesão do grupo social, isto é, da sociedade em si mesma.
Existe certo mistério, sobre as origens de certa parte das origens de grande
parte das instituições jurídicas no período pré-histórico, mas isso não quer
dizer que estamos às cegas quanto à questão.
Há um consenso quanto ao fato de que os
primeiros textos jurídicos estejam associados ao aparecimento da escrita, não
se pode pensar em considerar a presença de um direito entre povos que possuíam
formas de organização social e política primitivas sem o conhecimento da
escrita. Certo é que pesquisas dos sistemas legais das populações sem escrita
não se reduz meramente à explicação dos primórdios históricos do direito, mas
evidencia um enorme interesse, porquanto “milhares de homens vivem ainda
atualmente, na segunda metade do século XXI, de acordo com direitos a que
chamamos “arcaicos” ou “primitivos”. A título de exemplo as civilizações mais
arcaicas como os aborígenes da Austrália ou da Nova Guiné, os povos da Papuásia
ou de Bornéu, de certos povos índios da Amazônia no Brasil”, ainda mantém seus
sistemas legais sem nenhuma associação escrita necessariamente. Tendo em conta
estes apontamentos, cabe tratarmos de alguns aspectos do direito nas sociedades
primitivas como a formação, caracterização, fontes e funções.
1.1
Formação do Direito
com base nas crenças das sociedades primitivas.
Há uma dificuldade
no campo das ciências que estudam as formações do direito nas sociedades por
causa de algumas variações de hipóteses levantadas por tais especialistas. O
direito arcaico assim como o entendemos pode e certamente é um dos métodos mais
seguros para se apoiar uma interpretação a partir da compreensão do tipo de
sociedade que o gerou. Se a sociedade pré-histórica fundamenta-se no princípio
do parentesco, nada mais natural do que considerar que a base geradora do
jurídico encontra-se primeiramente, nos laços de consanguinidade, dentro da
família geradora, nas práticas de convívio familiar de um mesmo grupo social,
unido por crenças e tradições.
É neste sentido que
a lei primitiva da propriedade e das sucessões teve em grande parte sua origem
na família e nos procedimentos que a circunscreveram, como as crenças, os
sacrifícios e o culto aos mortos. Ninguém melhor que Fustel de Coulanges para
escrever que o direito antigo não é resultante de uma única pessoa ou da
vontade de um único grupo prevalente, pois se impôs a qualquer tipo de
legislador, nasceu espontânea e inteiramente nos antigos princípios que
constituíram a família, derivando das crenças religiosas, universalmente
admitidas na idade primitiva desses povos e exercendo domínio sobre as
inteligências e sobre as vontades. Num tempo em que inexistiam legislações
escritas, códigos formais, as práticas primárias de controle são transmitidas
oralmente, marcadas por revelações sagradas e divinas.
Distintivamente da
ênfase atribuída à família feita por Fustel de Coulanges, outro autor como H.
Summer Maine entende que esse caráter religioso do direito arcaico, imbuído de
sanções rigorosas e repressoras, permitiria que os sacerdotes-legisladores
acabassem por ser os primeiros intérpretes e executores das leis. O receio da
vingança dos deuses, pelo desrespeito aos seus ditames, fazia com que o direito
fosse respeitado religiosamente, Daí que, em sua maioria, os legisladores
antigos (reis sacerdotes) anunciaram ter recebido as suas leis do deus da
cidade. De qualquer forma, o ilícito se confundia com a quebra da tradição e
com a infração ao que a divindade havia proclamado, o direito antigo
compreende, claramente, três grandes estágios de evolução: o direito que provém
dos deuses, o direito confundido com os costumes e, finalmente, o direito
identificado com a lei.
Algumas
experiências societárias, ao permitirem o declínio do poder real e o
enfraquecimento de monarcas hereditários, acabaram por favorecer o surgimento
de classes aristocratas, depositárias da produção legislativa, com capacidade
de julgar e de resolver conflitos. Mas este momento inicial de um direito
sagrado e ritualizado, expressão das divindades, desenvolve-se na direção de
práticas normativas consuetudinárias. Por ser objeto de respeito e veneração, e
ser assegurado por sanções sobrenaturais, dificilmente o homem primitivo
questionava sua validez e sua aplicabilidade. A inversão e a difusão da técnica
da escritura, somada à compilação de costumes tradicionais, proporcionam os
primeiros códigos da Antiguidade, como o de Hamurábi, o de Manu, o de Sólon e a
Lei das Doze Tábuas. Constatam-se, destarte, que os textos legislados e
escritos eram melhores depositários do direito e meios mais eficazes para
conservá-lo que a memória de certo número de pessoas, por mais força que
tivessem em função de seu constante exercício, aos poucos a tradição dessas
leis orais foram se modificando e alterando a forma justificando assim a
necessidade de seu registro.
1.2
Características e fontes do Direito arcaico
Para uma definição de Gilissen¹
primeiramente, o direito primitivo não era legislado, os povos não conheciam a
escritura formal e suas regras de regulamentação mantinham-se e conservavam-se
pela tradição oral. Um segundo fator de conhecimento é que cada organização
social possuía um direito único, que não se confundia com o de outras formas de
associação. Cada comunidade tinha suas próprias regras, vivendo com autonomia e
tendo pouco contato com outros povos, a não ser em condições de guerra ou
conflito. Um terceiro aspecto a considerar é a diversidade dos direitos não
escritos, trata-se da multiplicidade de direitos diante de uma gama de
sociedades atuantes, de um lado, da especificidade para cada um dos costumes
jurídicos, de outro, de possíveis e inúmeras semelhanças ou aproximações de um
para outro sistema primitivo, o direito arcaico está profundamente contaminado
pela prática religiosa.
Essa é a influência da religião sobre
a sociedade e sobre as leis, que se torna pouco fácil estabelecer uma distinção
entre o preceito sobrenatural e o preceito de natureza jurídica. Na verdade, o
direito estava totalmente subordinado à imposição de crenças dos antepassados,
ao ritualismo simbólico e à força das divindades. O sincretismo mesclava e
integrava, no aspecto religioso, as regras de cunho social, moral e jurídico, do
pouco que se sabe é que, com certeza, pode-se apontar, as fontes jurídicas
primitivas são poucas, resumindo-se, na maioria das vezes, aos costumes, aos
preceitos verbais, às decisões pela tradição.
No que concerne aos costumes, há de
se reconhecer como a fonte mais importante e mais antiga do direito,
manifestação que se comprova por ser a expressão direta, cotidiana e habitual
dos membros de um dado grupo social. Novamente, aqui, a religião aparece como
fenômeno determinante, na medida em que o receio e a ameaça permanente dos
poderes sobrenaturais é que garante o rígido cumprimento dos costumes.
De modo que neste quadro, colocam-se,
igualmente, certos preceitos verbais, não escritos proferidos por chefes de
tribos ou de clãs, que se impõem pela autoridade e pelo respeito que desfrutam.
Trata-se de verdadeiras leis ainda que não escritas, repousando no prestígio
daqueles que detêm o poder e o conhecimento, o eminente pesquisador belga
citado Gilissen acrescenta também os procedimentos orais propagados por
gerações como os “provérbios e adágios” também serviam como regras legais aos
povos.
™cf. GILISSEN,
John. Introdução histórica ao direito. Lisboa: Fundação Calouste
Gulbenkian, 1988, p. 35.
1.3
Funções e fundamentos do Direito arcaico
Inicialmente, constata-se que em cada
cultura humana desenvolve-se um corpo de obrigações, proibições e leis que
devem ser cumpridas por motivos práticos, morais ou emocionais. Há que se
considerar, para Bronislaw Malinowski (1884-1942), que além das regras jurídicas
sancionadas por um aparato social com poderosa força coagente, subexistem
outros tipos diferenciados de normas tradicionais gerados por motivos
psicológicos. Naturalmente, a base de toda investigação do direito primitivo
está na imposição rígida e automática aos costumes da tribo. O direito é mais
um aspecto da vida tribal, ou seja, um aspecto de sua estrutura do que
propriamente um sistema independente, socialmente completo em si mesmo, define
o iminente pesquisador citado¹. É neste contexto que se deve interpretar o
direito primitivo. A função principal do direito é, para Malinowski, liminar
inclinações comuns,
“canalizar e dirigir os instintos humanos e impor uma conduta obrigatória
não espontânea (...)”, assegurando um modo “de cooperação baseada em concessões
mútuas e em sacrifícios orientados para um fim comum. Uma força nova, diferente
das inclinações inatas e espontâneas, deve estar presente para que esta tarefa
seja concluída.”2.
Assim, o papel do direito é
fundamental como elemento que regula, em grande parte, os múltiplos ângulos da
vida dos grupos primitivos e.
“as relações pessoais entre parentes, membros do mesmo clã e da mesma
tribo, fixando as relações econômicas, o exercício do poder e da magia, o
estado legal do marido e da mulher, etc.”. ³
Em suma, de todos os sistemas de
regras legais das sociedades primitivas, o destaque maior é atribuído ao
direito matrimonial. Não só é o mais abrangente sistema legal, como o
fundamento essencial dos costumes e das instituições. A força do direito
matriarcal define que o parentesco só se transmite através das mulheres e que
todos os privilégios sociais seguem a linha materna. Daí decorre a rigidez da lei primitiva com relação ao
comércio sexual dentro do clã, fundamentalmente, no que se refere ao crime de
incesto (principalmente com a irmã) que gera práticas de punição mais severas.
Assim citamos alguns aspectos das funções do direito primitivo dentro das
sociedades antigas essencialmente ele acaba por regular as relações mais
interiores da vida do homem na tribo ou clã.
¹ Cf.
MALINOWSKI, Bronislaw. Crimen y costumbre en la sociedad salvaje. Barcelona:
Ariel, 1978
² MALINOWSKI, B. Op. cit., p. 79-80.
³ MALINOWSKI, B. Op. cit., p. 82.
Como vemos o direito e a religião sempre estarão atrelados. Muito bom meu caro amigo e parabéns pelo blog gostei bastante é disso que necessitamos de bons materiais. Abs
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